Vladimir de Alcântara Puntel Ferreira
DF produz 350 toneladas de lodo de esgoto por dia
O superintendente de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Caesb, o engenheiro florestal e de Segurança do Trabalho Vladimir de Alcantara Ferreira, está na Caesb há 36 anos, desde os tempos de estagiário. Ele aponta que temos garantia de abastecimento de água até 2040, apesar do desafio de rios com pouca vazão e o crescimento contínuo do DF. E defende a adoção de novos negócios de saneamento, como a utilização do lodo de esgoto e a geração e energia nas estações de tratamento. Conheça um pouco de sua história.
Você atuou toda sua vida profissional na Caesb?
Fiz engenharia florestal na UNB. Primeiro eu fiz um estágio no Jardim Botânico e em 1986 fui chamado para estagiar na Caesb. E estou lá desde então. Toda a minha carreira foi na área de meio ambiente, atuando na proteção de mananciais, estudos e recuperação de áreas degradadas, recuperação do meio ambiente, mas o principal sempre foi o saneamento.
Participei de diversas gestões na Caesb, trabalhei na Divisão de Proteção Hídrica e agora na Superintendência de Meio Ambiente e Recursos hídricos, que é a mais transversal da Caesb.
Temos quatro eixos de trabalhos bem definidos: o eixo de licenciamento ambiental dos empreendimentos de saneamento, água, esgoto; o eixo de proteção de mananciais; o eixo de recursos hídricos, que inclui estudos de outorga de captação e lançamento de efluentes, capacidade de autodepuração e a parte de hidrologia – coleta e análise de dados hidrológicos. O DF é a unidade da Federação que tem a malha mais densa de coleta de dados pluviométricos e fluviométricos. E o quarto eixo é o de gestão ambiental da empresa, a política ambiental, gestão de resíduos especiais, protocolos de boas práticas em relação à coleta e disposição de resíduos especiais e educação ambiental. Esse é o universo de trabalho em que estamos inseridos.
Qual sua avaliação da Caesb?
Em termos de nível de tratamento de esgoto, o DF é inigualável. Temos quase a universalização dos serviços de saneamento, apesar de ser uma das mais desiguais unidades da Federação, com uma discrepância social muito bem refletida, com alta e baixíssima renda.
Em sua história, a Caesb tem tradição de proteção de mananciais, até porque muitas unidades nossas estão em unidades conservação. Antes mesmo do estabelecimento da agência reguladora, a empresa já exercia essas funções de maneira própria. Mesmo com a transição para o ambiente regulado e licenciado, a Caesb manteve em seu DNA a competência para exercer funções que estão hoje com órgãos reguladores.
A Caesb tem um portifólio de grande competência, com empregados muito bem avaliados, a empresa é muito elogiada nos fóruns em que participa. Temos um vínculo amoroso com a empresa, as pessoas que trabalham lá defendem a empresa e os interesses do saneamento, entendido como algo que tem que ser estendido a toda população e não só a quem tem condição de pagar. Ampliar esses serviços para quem não pode pagar é função social do estado e a Caesb, como instrumento de gestão de saneamento do DF, faz da melhor maneira possível o seu papel, sempre procurando melhorar.
Mas o desafio para atender toda a população é grande, não é?
Certamente. Não temos um rio Tietê, ou um Paranaíba passando aqui, nossos rios têm pouca vazão. O DF cresce 40, 50 mil pessoas todo ano e é preciso oferecer escola, casa, transporte, saúde e saneamento. Temos que administrar essa equação que vai se replicando ao longo dos anos, com a limitação da quantidade de água disponível. No Sistema Corumbá, que se localiza em Goiás, a água captada é bombeada para Valparaiso e outra elevatória manda para o DF. A distância aumenta o custo.
No horizonte de saneamento vamos ter água para abastecimento até 2040, considerando um crescimento vegetativo da população de 2, 3% ao ano. O problema é como coletar, tratar o esgoto e lançar com padrão de qualidade em rios com vazão cada vez menor. Veja que estamos no final de outubro e tivemos poucas gotas de chuva. A vazão e disponibilidade hídrica estão cada vez menores e a diluição dos efluentes em curso de água com vazão cada vez mais reduzida é o grande desafio. O planejamento ambiental tinha que puxar o territorial, não o contrário. Teria que ter outro tipo entendimento para a criação de novas áreas residenciais, é preciso um freio de arrumação na medida em que adenso.
E há ainda que vencer o desafio da universalização.
Na área urbana o abastecimento é praticamente universalizado, de 88 a 91% do esgoto são coletados e 90% tratados. Mas o Novo Marco entra também com indicadores de saneamento rural. Mas o que não é coletado é atendido com soluções individuais, como fossas e sumidouros, que funcionam muito bem.
Nossas unidades de tratamento de esgoto estão bem à frente do Brasil, mas não é suficiente, temos que procurar outras soluções como, por exemplo, o reuso na agricultura de efluentes tratados. Temos que investir no reuso, criar dispositivos e regras para utilização de efluentes na agricultura, não podemos exportar recursos hídricos via esgoto, temos que aproveitar, manter esse recurso hídrico dentro do território do DF.
Produzimos 350 toneladas de lodo de esgoto por dia e todo esse lodo gerado tem que ser manejado e há protocolos de licenciamento de utilização. Temos as autorizações ambientais para utilização de lodo classe B em áreas degradadas e, na agricultura, lodo classe A. Essas autorizações são um grande avanço. Essa dinâmica foi implantada há pouco tempo, conseguimos dar disposição adequada, não estamos estocando, tem uma saída muito grande, temos sido muito procurados porque é uma fonte de matéria orgânica que diminui os custos na agricultura e melhora a qualidade do solo. Por enquanto o material é doado, mas o aproveitamento do lodo pode ser um novo negócio de saneamento, assim como podemos fazer aproveitamento de gases para gerar energia, em algumas estações há viabilidade técnica e econômica. Também é possível gerar energia hidroelétrica aproveitando a diferença de altura de nível para turbinas gerarem energia elétrica nas unidades. São vários eixos, rotas interessantes que a gente pode utilizar.
Temos também uma usina demonstrativa de produção de biodiesel a partir de óleos usados, o projeto Biguá, que está meio parado porque muita gente saiu da Caesb por programas de demissão voluntária, o que obrigou a empresa a se reposicionar. Mas vai ter concurso em breve para repor esse pessoal.
Como você vê o papel da Abes?
Já estou há muito tempo na ABES, devo ter me filiado em 1989, logo depois que entrei na Caesb, em 1986. Fiquei alguns anos fora, não renovei, até que há alguns anos, o João Marcos, querido amigo, me convidou para compor a chapa, aceitei, desde que não me cobrasse presença, pois tinha filho pequeno, mas ajudei e continuo como suplente do conselho fiscal.
Como você vê o papel da Abes?
É uma entidade de fundamental importância na discussão do saneamento, na sua consolidação como algo fundamental para a sociedade. Hoje estamos sob a égide da privatização do saneamento, é preciso discutir a quem interessa essa privatização e a Abes promove essa discussão de forma muito profissional e profunda.
Fale um pouco de sua vida pessoal
Gosto de trabalhar, vir para a Caesb um dia após o outro é fundamental para mim, mas fora do trabalho gosto muito de marcenaria, trabalho com torno, tenho oficina em casa, adoro mexer com madeira. Um outro hobby é o jiu jitsu, mas não é para bater em ninguém, é para ficar com a cabeça boa. Tenho três filhos, Vitor, Paula e André. E a Paula já tem uma filha, a Marina. André é engenheiro florestal, atua na área de inventario, Paula é professora de educação física e o Vítor está no ensino fundamental.